Textos "interessantes"

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A minha alma(a paz que eu nao quero)

A minha alma tá armada e apontada
Para cara do sossego!(Sêgo! Sêgo! Sêgo! Sêgo!)
Pois paz sem voz, paz sem voz
Não é paz, é medo!(Medo! Medo! Medo! Medo!)

As vezes eu falo com a vida,
As vezes é ela quem diz:
"Qual a paz que eu não quero conservar,
Prá tentar ser feliz?"

As grades do condomínio
São prá trazer proteção
Mas também trazem a dúvida
Se é você que tá nessa prisão.

Me abrace e me dê um beijo,
Faça um filho comigo!
Mas não me deixe sentar na poltrona
No dia de domingo, domingo!

Procurando novas drogas de aluguel
Neste vídeo coagido...
É pela paz que eu não quero seguir admitido.

É pela paz que eu não quero seguir
É pela paz que eu não quero seguir
É pela paz que eu não quero seguir admitido.

Composição: Marcelo Yuka
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Meus oito anos

Oh que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais

Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras,
A sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais.

Como são belos os dias
Do despontar da existência
Respira a alma inocência,
Como perfume a flor;

O mar é lago sereno,
O céu um manto azulado,
O mundo um sonho dourado,
A vida um hino de amor !

Que auroras, que sol, que vida
Que noites de melodia,
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar.

O céu bordado de estrelas,
A terra de aromas cheia,
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar !

Oh dias de minha infância,
Oh meu céu de primavera !
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã!

Em vez das mágoas de agora,
Eu tinha nessas delicias
De minha mãe as carícias
E beijos de minha, irmã !

Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
Pés descalços, braços nus,
Correndo pelas campinas
A roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis!

Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas
Brincava beira do mar!

Rezava as Ave Marias,
Achava o céu sempre lindo
Adormecia sorrindo
E despertava a cantar !

Oh que saudades que tenho
Da aurora da minha vida
Da, minha infância querida
Que os anos não trazem mais

Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras,
A sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!

Casimiro de Abreu
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Poema de sete faces

Quando nasci, um anjo torto

desses que vivem na sombra disse:

Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens

que correm atrás de mulheres.

A tarde talvez fosse azul,

não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:

pernas brancas pretas amarelas.

Para que tanta perna, meu Deus,

pergunta meu coração.

Porém meus olhos não perguntam nada.

O homem atrás do bigode é sério,

simples e forte. Quase não conversa.

Tem poucos, raros amigos

o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste

se sabias que eu não era Deus

se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo,

se eu me chamasse Raimundo

seria uma rima,não seria uma solução.

Mundo mundo vasto mundo,

mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer

mas essa lua

mas esse conhaque

botam a gente comovido como o diabo.

Carlos Drummond de Andrade

[...]

Poemas negros

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Ser negro é ser

Ser negro é ter a pelepintada de dor e beleza.
É ter consciência de que consciência, ainda nãoexiste.
Ser negro é ser dono da alegria, e generosamente dividi-la entre os filhos do preconceito.
Ser negro é ser brasileiro duas vezes.
É gritar não aos nãos da vida.
Ser negro é ter a liberdade disfarçada de alma
.Ser negro é ser.

Sintia Regina de Lima e Lira
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Resposta de um negro

Mesquinhez, sim é mesquinhez!
falar de negros como se não fora gente,
porque embora com a epiderme negra,
é como o branco que tem alma e sente.

Fala língua! Porque tu és carne
e por isso mesmo hás de perecer,
ficando a alma imortal sem cor,
que os nossos olhos não a podem ver.

A pele é negra, sim, esta nós vemos,
porém apenas distingue a raça;
com a pele negra posso ter por dento,
um'alma branca como o é a garça.

Embora negra seja a minha pele,
meu interior é alvo como o lírio,
por isso quando depreciam a um negro,
saio sorrindo sem sofrer martírio.

Sou negro sim, disto me orgulho,
meu sangue é puro, é sangue varonil,
se meu país é grande e valoroso,s
e deve ao negro isto que é o BRASIL.

O negro é forte resiste às intempéries,
chuva, sol, sereno, frio, calor,
trabalha sempre sem cansar os braços,
porque o negro trabalha por amor.

Por amor, sim, amor à liberdade
que lhe fora devolvida um dia,
pela Princesa que assinou a LEI,
chamada ÁUREA, a Lei da Alforria.

Joelson Araújo Matos
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Sou negro, quero liberdade!

Da veias D’África o negro saiu
Deixando pra trás mulheres e crianças
Os quais jamais os veria outra vez
Na sua bagagem apenas lembranças
De um tempo que não volta mais.

Pra terras distantes em mares navegou
Caminhos abertos em alto mar
Feridas na alma
Pra não mais fechar.

Presos e acorrentados
Muitas lágrimas e gemidos
Açoitados e castigados
Nas senzalas machucados e feridos.

Hoje luto por igualdade
Nas senzalas da sociedade
Porque sou cidadão
Quero liberdade.

Cledineia Carvalho Santos

[...]

Wanderson...!!!!

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lamento para a língua portuguesa
não és mais do que as outras, mas és nossa, e crescemos em ti. nem se imagina que alguma vez uma outra língua possa pôr-te incolor, ou inodora, insossa, ser remédio brutal, mera aspirina, ou tirar-nos de vez de alguma fossa, ou dar-nos vida nova e repentina. mas é o teu país que te destroça, o teu próprio país quer-te esquecer e a sua condição te contamina e no seu dia-a-dia te assassina. mostras por ti o que lhe vais fazer: vai-se por cá mingando e desistindo, e desde ti nos deitas a perder e fazes com que fuja o teu poder enquanto o mundo vai de nós fugindo: ruiu a casa que és do nosso ser e este anda por isso desavindo connosco, no sentir e no entender, mas sem que a desavença nos importe nós já falamos nem sequer fingindo que só ruínas vamos repetindo. talvez seja o processo ou o desnorte que mostra como é realidade a relação da língua com a morte, o nó que faz com ela e que entrecorte a corrente da vida na cidade. mais valia que fossem de outra sorte em cada um a força da vontade e tão filosofais melancolias nessa escusada busca da verdade, e que a ti nos prendesse melhor grade. bem que ao longo do tempo ensurdecias, nublando-se entre nós os teus cristais, e entre gentes remotas descobrias o que não eram notas tropicais mas coisas tuas que não tinhas mais, perdidas no enredar das nossas vias por desvairados, lúgubres sinais, mísera sorte, estranha condição, mas cá e lá do que eras tu te esvais, por ser combate de armas desiguais. matam-te a casa, a escola, a profissão, a técnica, a ciência, a propaganda, o discurso político, a paixão de estranhas novidades, a ciranda de violência alvar que não abranda entre rádios, jornais, televisão. e toda a gente o diz, mesmo essa que anda por tal degradação tão mais feliz que o repete por luxo e não comanda, com o bafo de hienas dos covis, mais que uma vela vã nos ventos panda cheia do podre cheiro a que tresanda. foste memória, música e matriz de um áspero combate: apreender e dominar o mundo e as mais subtis equações em que é igual a xis qualquer das dimensões do conhecer, dizer de amor e morte, e a quem quis e soube utilizar-te, do viver, do mais simples viver quotidiano, de ilusões e silêncios, desengano, sombras e luz, risadas e prazer e dor e sofrimento, e de ano a ano, passarem aves, ceifas, estações, o trabalho, o sossego, o tempo insano do sobressalto a vir a todo o pano, e bonanças também e tais razões que no mundo costumam suceder e deslumbram na só variedade de seu modo, lugar e qualidade, e coisas certas, inexactidões, venturas, infortúnios, cativeiros, e paisagens e luas e monções, e os caminhos da terra a percorrer, e arados, atrelagens e veleiros, pedacinhos de conchas, verde jade, doces luminescências e luzeiros, que podias dizer e desdizer no teu corpo de tempo e liberdade. agora que és refugo e cicatriz esperança nenhuma hás-de manter: o teu próprio domínio foi proscrito, laje de lousa gasta em que algum giz se esborratou informe em borrões vis. de assim acontecer, ficou-te o mito de haver milhões que te uivam triunfantes na raiva e na oração, no amor, no grito de desespero, mas foi noutro atrito que tu partiste até as próprias jantes nos estradões da história: estava escrito que iam desconjuntar-te os teus falantes na terra em que nasceste, eu acredito que te fizeram avaria grossa. não rodarás nas rotas como dantes, quer murmures, escrevas, fales, cantes, mas apesar de tudo ainda és nossa, e crescemos em ti. nem imaginas que alguma vez uma outra língua possa pôr-te incolor, ou inodora, insossa, ser remédio brutal, vãs aspirinas, ou tirar-nos de vez de alguma fossa, ou dar-nos vidas novas repentinas. enredada em vilezas, ódios, troça, no teu próprio país te contaminas e é dele essa miséria que te roça. mas com o que te resta me iluminas.

Vasco Graça Moura, in "Antologia dos Sessenta Anos"

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